sexta-feira, 19 de julho de 2013

LEIS COMPLICADAS - DEMOCRACIA CAPENGA

Numa entrevista realizada para o Chicago Humanities Festival, o economista Luigi Zingales, autor do excelente livro (já indicado por aqui) A Capitalism for the People, declarou que as leis mais eficientes e mais democráticas são àquelas mais simples. "Tão simples que até um congressista possa entender" - diz ele.

Refletindo sobre a questão, constata-se que ela encerra um grau de profundidade e importância que num primeiro momento pode até passar despercebido.

O ser humano não pode julgar e decidir sobre àquilo que não compreende. Obviamente a população de um país, vamos restringir nossa análise ao Brasil,  não tem obrigação de conhecer de tudo, mas numa democracia ela é convocada a tomar decisões acerca de a um amplo espectro de temas concernentes à sociedade a que pertence.

A democracia representativa surgiu para mitigar a impossibilidade óbvia do povo diretamente exercer de facto o governo das nações, cada vez mais populosas e demandantes de um número cada vez maior de serviços. Outra razão é que, ao delegar o poder de governo para um número seleto de cidadãos 100% dedicados à função, a eficiência seria majorada e o custo da administração tornar-se-ia mais sustentável

É como se o povo estivesse contratando, ao escolher o seu representante, um servidor com maior capacidade de compreender e exercer por ele a administração pública - legislar, julgar e executar.

Chegamos ao ponto destacado por Zingales. As leis podem ser simples ou extremamente complexas. Existem Constituições que não passam de 7 artigos e outras com mais de 400. Leis concisas e simples como a Glass-Steagal que regulava a atividade bancária nos EUA e que continha 24 páginas e leis complexas, detalhadas como a Dodd-Frank, uma espécie de sucessora da Glass-Stegal, com mais 250 páginas.

No Brasil a tradição legislativa é de ser uma das mais prolixas do mundo. Nossa Constituição está entre as mais extensas, nossas leis são abundantes e ricas em detalhes, tecnicismo, regras redundantes e linguagem rebuscada. É usual as leis no Brasil necessitarem de outras leis para explicar-lhe o significado e tornar-lá operacional. 

É ponto pacífico, por exemplo, a impossibilidade de estar 100% em dia com as exigências tributárias no país, dado o emaranhado absurdo de leis, regras e procedimentos - muita das vezes contraditório e ambíguo - existentes na nossa legislação fiscal. As áreas do direito civil, trabalhista, aduaneiro, criminal e administrativo também vão pelo mesmo caminho.

Nossos diletos deputados e senadores precisariam de alguns anos de leituras e aulas especiais para entenderem a maioria das leis que grassam nosso ambiente regulatório se quisessem decidir com propriedade de forma a atender os anseios de seus representantes.

A conseqüência é um excesso de invencionismo, tal é o grau de penetração das leis no país; o engessamento de mudanças haja visto o extenso número de matérias que a constituição resolveu botar o bedelho (até gratificação natalina de aposentado está regrado na nossa Carta Magna) e para mexer exige um quorum qualificado.

Mas a pior conseqüência do manicômio legislativo brasileiro é a debilidade com que representantes eleitos tomam suas decisões. Como vão tocar uma reforma tributária se não conhecem o que estão reformando ? como vão saber que determinada alteração no código trabalhista irá produzir os efeitos pretendidos pelo seus representados ?

O fato é que descambamos para uma espécie de democracia de advogados, uma democracia do marketing, uma democracia dos burocratas, uma democracia de compadres. E uma crise de representatividade.

Ficheiro:DiarioOficial escravidao35201.jpg

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Marcadores

Economia (23) Brasil (20) Estado (20) desenvolvimento (14) Dilma (13) democracia (13) inflação (12) política (11) PIB (10) governo (10) investimentos (10) sugestão de leituras (9) BNDES (8) corrupção (8) crescimento (8) história econômica (8) moral (8) Capitalismo (7) Mantega (7) Petrobrás (7) liberdade (7) EUA (6) dívida (6) educação (6) gasto público (6) intervencionismo (6) rent-seeking (6) carga tributária (5) lei (5) produtividade (5) protecionismo (5) Adam Smith (4) Impeachment (4) Marx (4) Mercado (4) cidades (4) ciência (4) egoísta (4) eleições (4) impostos (4) liberalismo (4) projeção (4) socialismo (4) Caixa Econômica (3) China (3) Friedman (3) Lula (3) Manifestações (3) The Economist (3) capitalismo de compadrio (3) constituição (3) crise financeira (3) economia comportamental (3) filosofia (3) impunidade (3) instituições (3) mensalão (3) superávit primário (3) violência (3) Banco Central (2) Bancos (2) David Friedman (2) Eike Batsita (2) Estatal (2) Fernando Henrique (2) PT (2) Roberto Campos (2) américa latina (2) analfabeto (2) balança comercial (2) compadrio (2) comportamento (2) comércio (2) confiança (2) confisco (2) conjuntura (2) consumo (2) desenvolvimentismo (2) desregulamentação (2) economistas (2) filosofia moral (2) finanças (2) frases (2) gastos (2) imposto (2) juros (2) justiça (2) marcas (2) pessimismo (2) previdência social (2) preço (2) privatização (2) reformas (2) representatividade (2) serviço publico (2) welfare state (2) Ambev (1) André Lara Resende (1) Apple (1) BETO RICHA (1) Banco Mundial (1) Bastiat (1) Big Mac (1) Bill Gates (1) Cato Institute (1) Chaves (1) Cisne Negro (1) Coréia (1) Deirdre McCloskey (1) DÉBT (1) Energia (1) Estado do bem estar social (1) Europa (1) FED (1) FHC (1) FMI (1) Facebook (1) Forbes (1) França (1) G20 (1) Gasto (1) H.L Mencken (1) Hume (1) ICMS (1) IPCA (1) Ilusão (1) Joaquim Levy (1) Jornal Nacional (1) Keyenes (1) Keynes (1) Krugman (1) LRF (1) Leviatã (1) Lutero (1) MST (1) Malthus (1) Mansueto Almeida (1) Mercosul (1) Michael Huemer (1) Ministério (1) Miriam Leitão (1) México (1) Nature (1) Nelson Rodrigues (1) Oposição (1) PARANÁ (1) Pesca (1) Reeleição (1) Ricardo (1) Risco Brasil (1) Ronald Coase (1) SAE (1) Santa Maria (1) Schumpeter (1) Seguro Desemprego (1) Selic (1) Simonsen (1) Stanley Fischer (1) The Machinery of Freedom (1) Toqueville (1) Veja (1) Von Mises (1) Walter Williams (1) Watsapp (1) alienação (1) analfabetismo (1) apocalipse (1) assistencialismo (1) autoengano (1) bailout (1) bolsa família (1) causalidade (1) censura (1) cinema (1) comunismo (1) conformismo (1) consumismo (1) contas públicas (1) controle (1) correlação (1) costumes (1) cotas raciais (1) crime (1) crise (1) critérios de medição (1) crédito (1) cultura (1) custo brasil (1) desemprego (1) desperdício (1) dever moral (1) discriminação (1) discriminação pelo preço (1) discurso (1) débito (1) econometria (1) educação pública (1) eonomia (1) espirito animal (1) felicidade (1) filantropia (1) fiscal (1) fisiologismo (1) funcionário público (1) ganância (1) governo; Iron law (1) greve (1) gráficos (1) guerra dos portos (1) icc (1) idiota (1) ignorância (1) igualdade (1) imobilidade (1) imprensa livre (1) incentivos (1) indivíduo (1) ineficiência (1) inovação (1) instituição (1) intuição. (1) livre comércio (1) livre mercado (1) macroeconomia (1) matemática (1) miséria (1) moeda (1) monopólio (1) monopólio estatal (1) mão-de-obra (1) negócios (1) neurociência (1) nobel (1) obras públicas (1) orçamento (1) padrão ouro (1) planos de saúde (1) poder (1) poder de compra (1) político (1) povo (1) preços (1) prisão (1) professor (1) recompensa do fracasso (1) renda (1) representação (1) retórica (1) saúde (1) segurança (1) shared spaces (1) shopping centers (1) sociedade (1) sociologia (1) subsídio (1) totalitarismo (1) trabalho escravo (1) tragédia (1) transporte público (1) troca (1) trânsito (1) urna eletrônica (1) utilidade (1) utopia (1) viéses (1) voto (1) vídeos (1) xisto (1) óbvio (1)

Postagens populares