Um dos mantras preferidos dos nossos diplomatas, governantes ou quem quer que vá discursar na ONU e outros fóruns mundiais é de que somos um país pacífico, que prefere o diálogo. Balela! Somos um dos 10 países mais violentos do mundo (clique aqui). São mais de 27 homicídios por 100 mil habitantes, no caso de jovens entre 14 e 25 anos o número de mortes aumenta para 54,8. Nem países em guerra declarada possui tal mortandade.
O Brasil tem taxa mais de 500 vezes maior do que a de Hong Kong e 137 vezes maior que a da Alemanha e da Austria. Das 50 cidades mais violentas do mundo nós temos 14 (clique aqui) entre elas. Maceió com mais de 135 homicídios por 100 mil habitantes ocupa o 3º posto global. Em São Paulo, um dos únicos 3 estados que possuem estatísticas históricas, detalhadas e confiáveis, é registrado mais de um crime por minuto (veja tabela no fim do post).
Vejo muito pouca discussão aprofundada sobre o assunto nas pautas dos governantes, no meio acadêmico ou até mesmo na mídia em geral. Normalmente mostram-se os casos mais assustadores (relembre alguns aqui, aqui e aqui), reporta-se o despreparo da nossa força policial e as manifestações de protesto que se seguem geralmente após o ocorrido. Muito pouco para um fenômeno tão grave e não condizente com um país com a posição econômica e de história não beligerante como o Brasil.
A revista The Economist recentemente reporta o curioso caso da queda vertiginosa dos índices de criminalidade dos países desenvolvidos (alguns nem tanto como a Polonia, Estônia, Portugal e Espanha). O primeiro fato que a reportagem chama a atenção é que ninguém previa tais melhorias há 20 anos atrás, muito pelo contrário, especialistas como o americano John Dilulio diziam que o mundo seria aterrorizado por jovens que não demonstravam nenhum respeito pela vida humana e desprovidos de senso de futuro. Mas o quê ocorreu na verdade foi o oposto:
"Some crimes have all but died out. Last year there were just 69 armed robberies of banks, building societies and post offices in England and Wales, compared with 500 a year in the 1990s. In 1990 some 147,000 cars were stolen in New York. Last year fewer tham 10.000 were...In countries such as Lithuania and Poland the gangsters who trafficked people and drugs in the 1990s have moved into less violent activities such as fraud."
A revista aponta ainda as diversas causas da queda nos índices: Envelhecimento da população (pois um ponto em comum em qualquer país é que os crimes são majoritariamente praticados por jovens); Aperfeiçoamento tecnológico da indústria anti-crime (exames de DNA, computadores, técnicas de medicina legal); automóveis com dispositivos anti-roubos e que simplesmente não funcionam sem códigos específicos que só o dono possui; melhoria das estatísticas e registros que possibilitam a prevenção; câmeras, alarmes e outros aparatos de segurança. A certeza da punição e a diminuição da recompensa por roubar (aparelhos eletrônicos cada vez mais baratos) também são interessantes causas apontadas.
O economista prêmio nobel Gary Becker desenvolveu na década de 60 um modelo econométrico do crime. Ao analisá-lo como uma atividade racional Becker chegou a importantes insights. Existem custos e benefícios associados ao ato: a possibilidade de ser pego, o risco de morte, de ser condenado e de ser execrado pelos pares são exemplos de custos. Já as recompensas econômicas são mais evidentes. Neste contexto, pôde-se derivar uma equação que descreve a quantidade de tempo gasto na atividade criminosa, por exemplo, como uma função de vários fatores:
y = f ( x1, x2, x3, x4, x5, x6, x7), onde:
y= horas gastas em atividades criminosas
x1= "salário" por hora ocupada em atividade criminosa
x2 = salário-hora em emprego legal
x3= renda de outras atividades que não o crime ou um emprego legal
x4= probabilidade de ser capturado
x5= probabilidade de ser condenado se for capturado
x6= sentença esperada se condenado
x7= idade
O mais importante é que ao encarar a questão sob o prisma científico, aplicando uma metodologia racional de análise é possível melhorar os diagnósticos, estabelecer hipóteses de ação, implantar políticas condizentes com as melhores práticas e, medindo os resultados alcançados, entender os pesos e relações de causa e efeito de forma mais precisa e eficiente. Foi isso que Becker fez e revolucionou o modo de se entender e combater o problema do crime nos EUA.
O certo é que para combater a violência, assim como na questão da educação, não existe uma bala de prata única que produzirá resultados instantâneos. Polícia, judiciário, sistema prisional e a sociedade como um todo, podem e devem fazer muito mais, a começar por melhorar o registro e a coleta dos dados para que se diagnostique o tamanho do problema e a necessidade de recursos a ser alocado na empreitada. De outra forma, estaremos cada vez mais ilhados em condomínios fechados e assistindo pela televisão cenários de guerra cada vez mais parecidos com aqueles mais comuns no oriente médio. É o Brasil se "Afeganistando".
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